Lembro-me da
monotonia de estar fechado em casa, sem ninguém, sem uma festinha, sem o
consolo de mãe… eram horas infinitas para ali sozinho. Talvez por isso tenha
sido um chorão, que não se sentia no banho linguístico, porque não estava
dentro do estádio de palavras-frases. Os meus pais e os meus dois irmãos mais
velhos nunca conseguiram datar, ou ouvir, com certeza, o aparecimento das
minhas primeiras palavras significativas. Nunca tive aquela família paciente,
aquele círculo familiar! Porque eu nasci no mundo de “cegos e surdos”.
Enquanto fechado, olhava por detrás dos vidros da janela -
com vista para o campanário da torre da igreja do Alto da Ajuda -, e lá estava
o galo. Um galo que representava um novo dia. E imaginava…
Imaginava dois seres… uma mulher e um homem, ali, juntinho
ao galo, numa pura representação do amor.
Na minha imaginação, este galo e estes seres
transportavam-me para um mundo mítico, que eu não conhecia e que, sem conseguir
perceber por que motivo, me parecia cada vez mais atraente.
Fechava os olhos e
insistia nos ambientes mais ocultos, e comecei a perceber o porquê do fascínio
repentino e crescente que me inundava a mente. Sentia-me muito feliz com a
minha imaginação, com o poder da mente.
Foi assim que comecei
a utilizar a mente para gerar uma energia negativa/positiva, para transportar o
eu e transformar o pensamento em dor. Bastava eu pensar em dores de cabeça,
febre ou ataques de tosse para, repentinamente, me aparecerem esses sintomas.
Tudo isto para atrair a atenção e conseguir uma semana do calor da minha mãe.
mdp
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